email para contactos:
depressaocolectiva@gmail.com

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

A casa


Cormac MCarthy, em A estrada, mostra que a nossa casa depende  muito mais das pessoas  do que das paredes. O pai e o filho, o laço, faz de casa onde quer que eles se encontrem. Chegar a casa depois  do dia de cão vale  muito. E não vale nada  se não estiverem as pessoas que queremos.
Tenho gente em terapia que vive sozinha. Desde mulheres  jovens e independentes a senhoras de muita idade. A propósito, a senhora do outro dia, que mal consegue percorrer a extrema do quintal, retomou a tese de mestrado sobre  Francisco Bugalho, o pai de Cristovão Pavia, poeta que já trouxe muitas vezes aos blogues. Poeta esquecido. Sem casa.
Dizia então que essa gente que vive sozinha é admirável.  Faço sempre a mesma pergunta, sobre o momento  em que metem a chave à  porta. Suponho que gostam, sobretudo as mais novas ( as outras é outro mato). Um antropólogo francês, Marc Augé, que já esteve em Portugal, pintava a casa das cores da retórica familiar: o sítio onde não temos de nos justificar. Deve ser por isso que quando chego a casa passo pela mulher, pelos filhos, atravesso a sala e desaguo no terraço com  a minha boxer e uma bola.  Passados dez minutos estou pronto para o ( bom)  pow-wow familiar.
E os que, nestes dias de retórica ácida, chegam a uma  outra casa, com gente  que está com outra cara e nada têm para dizer, muito menos  para ouvir?  Está por fazer o levantamento das baixas no refúgio.

9 comentários:

  1. Enfim, não terei sabedoria para fugir do lugar-comum…
    Com o tempo fui perdendo as pessoas de quem gostava e que viviam comigo no dia-a-dia. Momentos houve em que vivia sozinho e feliz; outros em que vivia em solidão e infeliz. Tudo na mesma casa, talvez intervalado por um dia ou dois. A solidão que transforma as casas grandes demais pode ser causa nossa, ou dela sermos vítimas. O tema não é simples, mas é dramático, nalguns casos. Mas disso, como de outras coisas, saberá muito mais do que eu.
    Lembro-me do Eça que falava na solidão que imprimiam as multidões estranhas. Tudo "coisas" que se ampliam nesta época que agora chega.

    ResponderEliminar
  2. "E os que, nestes dias de retórica ácida, chegam a uma outra casa, com gente que está com outra cara e nada têm para dizer, muito menos para ouvir? Está por fazer o levantamento das baixas no refúgio."

    Está por alterar a palavra refúgio, Filipe. De certa forma, era aí que queria chegar com aquele comentário lá para baixo sobre o anonimato. Não se chega à minha idade mandando bitaites como quem faz pipocas, essas companheiras de filmes. Se um blogue é terapia (e acho absolutamente que sim, sim, sim, com todas as exclamações possíveis), largar o anonimato (e repare que concedo 100% na invenção de um nome: que o Gervásio se torne Joaquim, que a Manuela se torne Paulina) é meio caminho andado para a eficácia da terapia. Agora, Anónimo? Anónimo? Uma identidade é meia estrada feita.

    ResponderEliminar
  3. Dizia então que essa gente que vive sozinha é admirável. Admirável, porquê?

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. está lá no texto:
      "E não vale nada se não estiverem as pessoas que queremos".

      Eliminar
    2. Admirável por saber viver sozinha? Os homens não sabem viver sozinhos. Preferem viver com sucedanios a estarem sozinhos, uma mulher já é mais difícil aceitar isso.

      Eliminar
  4. A minha casa sempre foi o meu porto de abrigo. Por isso é que passo o dia fora dela. Quando as miúdas eram pequenas e iam de férias para o pai passava dias meia zonza sem saber o que fazer. Agora que elas cresceram e seguiram a vida delas, saio de casa todos os dias faça chuva ou faça sol. Quando regresso sinto que cheguei ao paraíso. Maria

    ResponderEliminar
  5. É complexo sim senhora. Acho que a solidão que se sente em companhia é pior, mais terrível do que aquela que se sente sozinho.
    ~CC~

    ResponderEliminar
  6. E quando:
    "I hear that you're building your little house deep in the desert
    You're living for nothing now. I hope you're keeping some kind of record" ?

    estava por acaso a ouvir ...

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.