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domingo, 28 de julho de 2013

Intervalo

Uma semana mais difícil e depois uns dias sem net. Volto a partir de 15 Agosto ( se os deuses quiserem).
Fiquem bem.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Sexo de crise



O casamento ( com ou sem papel) já é antinatural, torná-lo ainda mais difícil não é boa ideia.
Já é antinatural porque é um produto da cultura. Os tipos da psicologia e biologia  evolucionária dizem que terá começado com com a frequência da ovulação : fica por perto ( de preferência à entrada da caverna e com carne fresca) porque nunca sabes quando é o dia... Depois, a sedentarização e a necessidade de reduzir  conflito pelos  direitos à brincadeira continuaram o trabalho. No Ocidente, o cristianismo fez o resto.
 Ora, se o natural é a poligamia e o casamento é cultural, alguma coisa tem de ser feita. Culturalmente Por exemplo: quinze anos juntos, começam o sábado a discutir por causa do arranjo do carro, continuam à tarde, regressando pela milésima vez ao mau feitio do pai dela e, depois, à noite, quando acaba o filme, o tipo começa a dar-lhe umas beijocas e a dizer-lhe vamos lá querida.  'Tá mal, 'tá claro que 'tá mal.
Os casais deviam ter aulas com os amantes. O cornudo devia ver vídeos do amante da mulher. Recordar, ou aprender, que a qualidade supera, de longe, a quantidade e que obom sexo começa às vezes com 48horas de antecedência.

Não me esqueci

Em breve  um e-mail para conversas em privado e a abertura  de um dia de consulta social para quem tem dificuldades.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Amar, derrotar






Ao contrário da vulgata, entendo que o amor pode , e deve, ser definido, estudado, esquartejado, analisado. Os nosso primos bonobos fazem tudo o que fazemos excepto cultura e  linguagem : por isso desconhecem o amor. Continuando a discussão sobre o não precisar do outro, abro mais um postigo: todo o grande amor é uma  derrota absoluta. Se quiserem, à Benfica, no minuto 92.
Quando sentimos que  a nossa vida está enroscada noutra e que a sua pele ainda tem o sabor do primeiro segundo, é óbvio que vamos perder o jogo. No Amor  & Ódio, conto a história de um casal de meia idade. Reformados, ela ainda  era vistosíssima, ele, músico de banda nas horas vagas,  parecia o Woody Allen. Estavam preparados para  a melhor fase das suas vidas, até porque ele tinha conseguido, finalmente, resolver um pequeno problema, digamos, fisiológico. Em seis meses ela morre de cancro da mama.
Se as famílias felizes não têm história ( Tolstoi) , os grandes  amores não têm felicidade.

terça-feira, 23 de julho de 2013

Let´s shake up

Este artigo , de um polemista conhecido, não diz só mentiras. Os departamentos  de  ciências sociais não estão assim tão parados, mas é verdade que às vezes parece que não nos libertámos do debate entre Margaret Mead e GH. Mead; há ou não comportamentos independentes da cultura?
Uma vez  defendi, numa palestra de um congresso de pediatria, que o  facebook não trazia nenhum perigo especial e diferente  para os meninos. Caíram-me ( amigavelmente ) em cima, claro, mas respondi que devíamos rever a forma como estudamos  os toddlers e os adolescentes. Por exemplo, analisar relações naquilo que nos anos 80 se chamava grupo de iguais, em que a rapaziada se encontrava nun café e ia conversar, charrar, beber, namorar, para casa de um deles, não faz sentido hoje.
Muito mais do que psicologia adolescencial, precisamos hoje de disciplinas que cruzem culturas de comunicação ou  tecnologia emocional.

domingo, 21 de julho de 2013

SPT sem você


Bonanno diz que as coisas más acontecem. Já aqui andei de volta do osso, não regressarei à resilência ( essa adaptação anglo-saxónica de estofo), interessa-me mais o célebre  Sindroma Pós-Traumático.
Quando era miúdo, via Henrique  Galvão , fascinei-me com o país   pequeno e pobre  que manteve uma guerra em três frentes africanas. Não compreendia. Depois fui coleccionando material ( algum  não publicado, porque o meu sogro era ocoronel), fui fazendo a minha formação política ( comparei com a guerra da Argélia, por ex.)e percebi que não foi bem uma guerra como Tucídides me ensinava: a esmagora maioria dos soldados só queria  estar  sossegado.
Mais tarde, quando fiz o serviço militar, esta ideia foi-me confimadíssima por muitos veteranos. Muito mais tarde, como profissional, fui coleccionando histórias de ex combatentes  em África. Juntando a minha experiência (a morte de um filho e mais um susto especial )  à  deles, percebi que o SPT é muito mais do que apenas uma má recordação.
Bonanno compara tudo: perdas de filhos e de amores, acidentes de viação, guerra do Vietname e do Afeganistão. A teoria, que já aqui trouxe,  é  a mesma, mas com uma pitada de Nietzsche : ao SPT escapam as personalidades equlibradas e previamente fortes, às quais a pancada torna ainda mais fortes. O SPT tem outras bordas e há uma que me interessa particularmente.
Não é tanto  a recordação, ou  o peso do episódio,  que faz com que a pessoa se vá abaixo. Existe um problema ontológico.O veterano do norte de Angola, por exemplo, acha que ter lá estado deu-lhe cabo da vida. Mais do que a memória das picadas traiçoeiras e dos camaradas esventrados, o que ele queria era não  ter lá estado.
O SPT encobre a dificuldade em  aceitar uma parte da nossa vida. Nem tudo são rugas que se resolvem numa ida à clínica de estética.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Bipolar quizz

A fronteira  é mais porosa do que a de El Paso-Juarez ou Valença-Tuy. Nos extremos, o quadro é identicável e ou  é uma desordem neuroquímica com incidência hereditária ou uma personalidade homoclítica ( normal de morrer) , mas no meio há muito sumo.
Faça o teste ( já fiz...).

terça-feira, 16 de julho de 2013

O segredo do amor

Não precisar do outro.
 Por estranho que pareça,  em mais de vinte  anos de consulta, as pessoas que conheci que mais felizes foram não precisavam do outro. Talvez não tão estranho. Seja uma relação de semanas  seja a de uma vida, o amor, a mistura certa de sexo, companhia, confiança e riso, é tanto melhor quanto mais independente. De tudo.
Se o outro está lá para nos resolver abandonos anteriores, inseguranças várias,  neuras, políticas de controlo ( posse e ciúme), precisamos dele. Torna-se um artefacto, o amuleto sem o qual a vida não faz sentido,uma tenebrosa confissão de impotência.
Se, no entanto,  o outro faz parte do nosso  gosto pela vida, torna-se, ipso facto, parte  de nós. Em momento nenhum o desmentiremos, nunca diremos que a vida não faz sentido sem ele. Nenhuma parte da nossa vida se sobrepõe ao todo, não nos cabe decidir sobre o que tem existência própria.
É por isso que o amor é eterno.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Negados


Os adolescentes são muito mal vistos nas colunas de opinião. Mea culpa, uso muitas vezes a expressão atitude adolescencial, mas com luvas : aplico-a em adultos. Os adolescentes são também vítima de assédio  pseudopsiquiátrico: parece que é preciso fazer um curso para ter um em casa. Em cada dez pedidos de ajuda que recebo, reenvio oito à  procedência. Treinar ( ensinar maneiras, bons hábitos, levar a gastar energias, brincar etc), só treino cães.
Mal ou bem, cresci, como muitos, com irmãos, primos, sobrinhos.Dá-me pena conhecer adolescentes enfiados num T2 com os pais, a playstation e o computador. .Sempre houve, é verdade, adolescentes narcisistas,mimados, incapazes de aproveitar a vida. Também há adultos assim. E velhos. Não é por aí.
O que me preocupa, nesta Atlãntida agora Portugal, é que os adolescentes estejam a envelhecer  muito depressa. Sinto-os a viver os problemas dos pais: o desemprego, a hipoteca, os cortes, a tristeza.
Talvez  este crescimento acelerado os distraia da vida electrónica e artificial, talvez não seja totalmente mau. Por outro lado,  há miúdos que se começam a sentir como um fardo. Económico, emocional ( a mãe tem de carregar  nos ansiolíticos receitados para  a crise) e, sobretudo,  político: não produzem, só se divertem, os danados...

sábado, 13 de julho de 2013

Os fins justificam os fins


Os assassinos das suas mulheres recebem uma compreensão que é negada aos suicidas. O laço emocional,  a raiva, até a violência , parecem explicar.  Conferem, pelo menos, terra ao vaso. O suicida fica sempre sozinho na sua desistência, na sua cobardia, dizem alguns. Comparação bizarra esta? Nem tanto. Em ambos os casos a mesma doutrina: os fins justificam os fins.
Jacquemort, o psiquiatra com laivos de obstetra do L'Arrache Coeur, conclui, a certa altura, diante da paixão que Clémentine tem pelos filhos, que gostaria de poder sentir uma, mas, à falta de melhor, pode sempre  ir observando.
Quando matamos o  nosso amor e  quando nos matamos ( muitas vezes dois em  um) também observamos. O quê? Como seria a vida se tivéssemos uma.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Perdida

Vinte e muitos mas já sem estômago ( um resíduo). Sem trabalho, porque quando regressou das cirurgias e  da quimioterapia, o posto de trabalho, por causa da crise,  estava extinto como o pássaro Dodó. Vive numa aldeia, com a mãe,  onde anoitece  muito depressa. Tem medo. Discordo.
Dizia o dinamarquês sorumbático que a angústia é  a etapa psicológica que precede o medo. A nossa perdida  inverte  a equação: agora sente  angústia, antes teve medo. De cada vez que tenho dificuldade em engolir, fico cheia de medo.São só palavras.
Fala baixinho, é bonita, tem um cabelo e uns olhos parecidos com os da mãe dos filhos  do Don Draper ( para quem vê  Mad Man) . A angústia dela é um protesto burocrático contra o anti-destino: sente que não pode esperar mais nada deste mundo.
Falamos muito. Ao vivo e no e-mail que sobrevoa serranias até chegar, nem sei como, à sua aldeia. O que lhe digo ? Não desisto de ti.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Elas falam, eles ouvem


Aviso: isto só se aplica a casais antiquados, ou seja, hetero e  casados, ou  juntos, há muito tempo.
A queixa é recorrente  nelas. Chegam a casa, miúdos já crescidos e nas suas vidas, e querem conversar.Com  a vida mais difícil, mais aconchego querem.  Os marrões  respondem por monossílabos.
Se lerem o Dunbar ( os distraídos), que eu o Luís Januário andámos a discutir na Idade Média da blogosfera, percebem que  "cimento social" são elas. Se dependesse dos homens, mesmo a mais pequena das aldeias seria Tóquio no que toca  a novidades. Nas famílias, quem une,  cose e restaura as relações são elas. E com o quê? Com a língua.
A pergunta de cem milhões que elas me fazem é: Por que é ele assim? Ficam tanto mais picadas quando o vêem muito falador com os amigos na Junta, no clube de bola, nos casamentos.É uma boa pergunta, porque a resposta está na pergunta.
Eles foram  sempre assim, elas é que mudaram.Passou o tempo de fazer a casa, criar os miúdos, veio a meia idade e eles ali ao lado. Elas começam a pensar neles como um amigo, um companheiro, uma extensão doméstica do seu mundo de cumplicidades e gossip. Eles não estão nem aí. Eles  dizem-me que não falam porque já falaram tudo. É claro que se caírem por uma jovem colega de trabalho a coisa muda. Claro, tem de se trabalhar a relação.Claro.
 A rainha Sofia dizia que o silêncio mata o amor. Tem razão. Sabem elas e, pelos vistos,  eles também.

domingo, 7 de julho de 2013

Do controlo

As ideias da Genie são comuns, mas no último parágrafo ela aponta o único caminho: não podes controlar as finanças mundiais  mas podes controlar as tuas. Ao limite ( fome, frio, sede) isto é verdade. Antes do limite, também. Resta o link entre ansiedade e controlo.
Nunca conheci sofredores tão profissionais como aqueles  que pretendem controlar todos os aspectos do meio em que vivem ( família, amigos,doenças,  trabalho, cão, vizinhos etc). Os distúrbios obsessivos ( com ou sem manto compulsivo-verificativo)  e  fóbicos devem, todos sabemos, à patologia do controlo.  Acontece que, como lembra  a Genie,  o controlo razoável pode ser  saudável. O difícil é estabelecer a linha.
Um teste do algodão é a saúde. O controlador patológico, quando detecta  um sintoma,  receia exames complementares. Isto pode parecer contraditório, mas não é: enquanto não souber se tem cancro ou está diabético, controla ( ilusão...) o desfecho. Na ansiedade económica ocorre um desvio semelhante.
Se tivermos controlo sobre a mania do controlo, caímos menos em desespero porque aceitamos a componente instável da situação. Pelo contrário, se somos patologicamente  obcecados pelo controlo, enredamo-nos no exame minucioso e sistemático de todos os perigos. Até à exaustão.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

A imperatriz agitada


O grande Montale, no Extermínio das Águias, diz que não tem simpatia por nenhuma lei, ou seja, gostaria  que as coisas que não se fazem fossem indicadas aos homens  pela sua  consciência e que o acordo fosse universal. É uma boa  abertura para falarmos da imperatriz agitada: a ansiedade.
Se fizéssemos  ou deixássemos  de fazer,  sempre, o que a nossa consciência  dita, pouco mercado haveria para os ansiolíticos ( em alternativa, uma  banana sossega o estômago). Protestam: Então e a ansiedade provocada, por exemplo, pela doença de um filho ou pela viagem perigosa de um companheiro? Pois é, mas distingo ansiedade de angústia,  essa princesa envenenada ( que fica para outra monda).
 A ansiedade é credora das nossas acções, é uma mola que  dispara quando ficamos  conscientes de que as coisas não estão a correr bem porque  não as estamos  a fazer bem. O "bem" aqui é relativo: o assassino pode ficar ansioso  porque o tipo a quem enviou  duas ameixas  ainda respira.
Quando uma sociedade vive em sobressalto, como a nossa vive agora, isso significa que o ambiente  fica ainda mais instável, mais imprevisível,logo,  mais gerador  de anisedade. Há pessoas que me dizem:  O que quer que eu faça parece que é mal feito. Se resolvo um problema, aparecem logo mais dois".
Os ansiolíticos são bons mas destreinam-nos. Uma resposta à ansiedade, ao alcance de todos, passa pela prevenção. Vive a tua vida sem te colocares em palcos onde tenhas de agradar a senhores  impiedosos, vive  a tua vida sem que tenhas de te trair.

Estes dias quadrados parecem  dar razão a Montale, desta vez numa pequena frase que podemos dedicar aos grandes decisores " Fizemos  o nosso melhor para piorar o mundo.



quarta-feira, 3 de julho de 2013

A única coisa



    






 Na sequência da discussão anterior, o que se pode opor à perda de lei ( o nosso amor, um filho, um pai querido etc)? Tanto quanto sei hoje, misturando a experiência pessoal, a profissional e as leituras, só existe uma coisa. Uma única coisa.
Recapitulemos. As grandes perdas são  histórias de destruição natural, como as de Sebald, Arrasam planos, esperanças, sim, mas também a vontade e o quotidiano. Um pouco como um avião que nos leva para um fuso horário desconhecido, num descampado onde até as nossas mãos não parecem nossas. Basta sentar-mo-nos à mesa, à hora habitual, e olhar para  a cadeira agora vazia: jet lag demoníaco.
A rotina é uma aliada. Como nas cidades destruídas, reerguer as paredes, limpar um poço, procurar batatas velhas. Ou seja, levantar cedo, ir trabalhar, suportar  o trânsito. Não chega, essa pele fina de normalidade.
A unica coisa com potencial  equivalente à destruição é a criação. John só muito tarde percebe o que é o  grande malogro -  "não ser nada" -  quando Mary morre finalmente. A Fera na Selva  vale por uma enciclopédia de psicologia, porque mostra o axioma numa cronologia contrariada.
E o   que é criar por oposição  a perder? É pintar, escrever, ler, plantar, fazer um amigo, arranjar um amante, ter um filho, enfim, fazer de novo. Só assim a perda se integra e  ocupa o seu lugar na ordem natural das coisas.


segunda-feira, 1 de julho de 2013

Fazer-se à vida



De repente, um adulto fica a braços  com  a morte dos pais no espaço de um ano. E uma morte lenta, cativa de  recapitulações, planos, cacos soltos de esperança escorrida  como vinho na taberna. Enfim, o processo habitual de volta à arena numa praça deserta.
Contam-me um misto de recomeço com meta cortada. É  suposto continuar, tudo faz parte da lei natural, mas há qualquer coisa que não bate certo. Temos  sempre tantos planos para os nosso pais, não é? Que envelheçam bem, que sejam os melhores da hidroginástica, que não usem andarilho etc.
Ficamos mais  duros, alguns mais confiantes, outros afundam-se no relambório do que não chegou  a ser dito ( a máxima expressão da menoridade). O que é certo é que esquecemos  a forma. É que a lei natural ( eles têm de morrer) não manda que assistamos à agonia sucessiva.
Faz alguma  diferença? Faz: a dor devia ser  limpa  e espaçada. É  assim que os leões matam.