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segunda-feira, 1 de setembro de 2014

A perda e a criação

 Muito  antes de publicar  sobre a perda já predicava na clínica sobre o sistema que conheço bem demais. Mais do que o trabalho, a única coisa que podemos  opor  ao desastre é a criação. Vem isto a propósito  de uma pequena aposta que  fiz comigo: se aquela mulher ( Judite  de Sousa e só menciono factos  públicos) regressar ao trabalho em três meses, está salva. Ganhei a primeira  parte...
Comparo uma perda brutal a uma cidade bombardeada. Nos dias seguintes não há nada: água, luz, tempo, crianças a brincar. Aos poucos um homem começa  a vender umas batatas velhas, outro descobre um poço e começa  a puxar água, uma mulher  recolhe  dois orfãos etc.
A resposta proporcional, a única que podemos contrapor à destruição é  a criação. Mais nenhuma tem a mesma dignidade e força. Vemos assim que não basta o trabalho. Tem de haver  uma sobreposição ao  fatum e tem de passar pela criação de mais fatum. Pode ser  um novo projecto, um novo amigo, criar leitões, o que quiserem.
Sachsenhausen foi o primeiro campo de concentração  a usar o Arbeit macht frei ( o trabalho liberta) à entrada  ( Hoss copiou-o  depois para Auschwitz). Acertaram, as bestas, mas substituiria trabalho por criação.

6 comentários:

  1. Sou mãe de filhos e se algum deles morresse uma parte enorme de mim morria também, e só não morria toda porque os outros iam precisar tanto de mim e eu não podia negar-lhes a minha presença, o meu apoio, o meu amor. Trabalhar também tinha de ser, até porque temos de comer... Claro que um emprego anónimo será seguramente mais fácil de retomar do que um emprego envolvido em mediatismo. O que já não compreendo, e custa-me a aceitar outra justificação que não seja "fazer chorar as pedras da calçada", é o genérico do programa, com a exibição do estilo "luto-chique", que envolve até a escolha de adereços a condizer (um anel gigante, preto...) e afins. Isso é exploração da imagem para ganhar audiências, e nada mais. Mas é apenas a minha opinião.

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    1. pois não vi o programa, raramente vejo o entertainer -mor.

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    2. mas nem sempre é assim: há pessoas que não conseguimos pôr a trabalhar outra vez...

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  2. Caro FNV, a analogia está muitíssimo bem esgalhada. Eu, e que Deus assim me mantenha, livre de tamanhas tragédias, presumo que morria, todos os dias, até morrer! Constranjo-me, com enorme compaixão, ante os pais que já tiveram de enterrar um filho! Mas há um ponto que, sendo ou não intrigante, me desperta um elevado interesse.
    O facto, causa concausa, será sempre equivalente!? No sentido de se abstrair em absoluto da causa da morte (ou da destruição)!!? Em que sentido poderemos distinguir a perda (morte, destruição), dos que perdem, por facto imputável culposamente a outrem (ou, nos casos de destruição, ao próprio ou próprios em termos colectivos) e por facto proveniente do acaso, do puro absurdo, de uma propriedade minguante intrínseca ou da manifestação divina!!??
    Na analogia que aqui nos trouxe sou convocado a pensar as mil imagens de cidades bombardeadas e, simultaneamente, a destrinçar entre os que se vêm vítimas e se animam de revolta apertando laços de irmandade com o vizinho e assim redimem as perdas e a destruição dos que se enegrecem da vergonha da destruição que sofrem, com a contrição de causadores, cedendo à letargia e minguando isoladamente!! Será!? Ou é elementar equívoco da tentativa de dar sentido ao mundo e à alma das gentes!!?
    Um bem haja

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    1. A culpa? Do meu ponto de vista é outra gaveta, pese existir por vezes passagens secretas, sim.

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  3. Sei bem do que fala, como sabe, que já aqui vim um ou outra vez falar da perda de filhos. Se de alguma forma os filhos são o princípio da nossa eternidade, à Judite de Sousa a vida tirou-lhe isso, por ser mãe de filho único. Não é despiciendo.
    Quanto à criação ser a única coisa que vence "essa" barbárie, tendo a concordar consigo. Havia a fé, a descoberta do sentido da vida, mas não sei se isso são outras gavetas.

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