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quinta-feira, 16 de maio de 2013

Outra troika

Fome, desemprego  e solidão. No continente culpam uns, na Madeira culpam outros. Tanto faz. Estas  três palavras parecem juntar-se com harmonia. Lido assim, sem pôr  nomes e caras, a coisa engole-se Tiro  a fome - quem vem à consulta consegue comer - e fico como os dois ases.
A situação mais comum é a da pessoa entre os 30 e os 50 que ficou desempregada. Se for, por exemplo, mulher e divorciada, a conversa azeda. Os homens vão para os copos,  têm sempre uns biscates ( sobretudo os daquelas zonas arraçadas de cidade) , uns tijolos a  assentar para um primo, umas voltas com o tractor do vizinho. Elas não.
L., tem 48 mas parecer ter 60. Divorciada há dez anos,  escriturária e semi-contabilista, um filho já crescido  noutro ponto do país, duas relações que acabaram muito mal. Not a charmed life. A empresa vai fechar. O que se diz a uma pessoa assim? O pudor resguarda-me do "tem de lutar", do "ainda é nova" etc. Tem uma amiga, mais nova,   nas vinhas para os lados de Pau. Óptimo, uma  aberta, recosto-me e passo de trivela. Ela não precisa de dizer nada. É esta a minha recompensa? À beira dos 50, sozinha, ir trabalhar na agricultura para Farnça? Para quê?
"Para quê?" é a pergunta certa.   A devastação inspira estas reflexões de condenado. Noutro  planeta  chamam-lhe mobilidade empreendedorismo.

4 comentários:

  1. SEI lá pra continuar viva ?
    nos anos 80 havia velhotas de 60 que pareciam ter 80 a fazer isso na renault
    por 100 francos ao dia a faire la ménage
    e nos anos 90 russos de 70 anos e reformados com 300 rublos ao mês uns anos antes a carregarem tijoleira de cimento e barris de ácido por 64 libras semanais
    o que até foi bom porque antes os velhos a estragar as costas do que eu

    porque é que faziam isso?
    e para quê?
    bolas nem me questionei a mi porque o fazia..

    acho que nunca o saberei

    o eu que era eu emigrou um dia e até hoje não voltou

    e o gajo inda me deve uns 6contos e quinhentos que lhe emprestei em 81

    filho du pai e do spirito sanctum

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  2. Viver ou sobreviver?
    Curioso, basta escarrapachar o prefixo para virar o sentido do avesso. Seja como for está mal aplicado: devia dizer-se subviver...

    Texto fantástico. Retrato amargo da sua profissão. O ultimo parágrafo, por si só, é meio post.

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