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quarta-feira, 10 de junho de 2015

Duas estóicas em carne e osso

Não tenho culpa da redução popular  do estoicismo à resistência e à abnegação: é um disparate abominável.  Hoje trago-vos dois casos reais  de pessoas que seguem uma velha regra de Crísipo: o prazer não é um salário, o amor   e a honestidade só existem se desinteressados.  São duas mulheres que tenho em terapia/ seguimento e em comum só o facto de serem louras e elegantes:

P.  trabalha  na banca, tem 32 anos, benfiquista, aguarda  há muito tempo ( uma  eternidade, vocês nem acreditariam se vos contasse)  que o seu amor decida entre ela  e outra. Enquanto espera não cede um milímetro ao que entende  dever ser a  vida, mas dá o corpo todo de cada vez que ele a  procura. Não esconde o que quer, não se importa com o que não recebe.

M.J.  42 anos, é cientista e substitui Dâmocles no banquete de Dioníso-o-Velho em Siracusa.  Tem um corpo biónico em virtude do avanço da técnica e de uma doença,  embora só o olhar traia por vezes a condição.  Trata a  fragilidade como um cão danado, aproveita todas as migalhas, guarda as fatias saborosas para quem precisa delas.  A espada pende  sobre a sua cabeça, mas calcula a distância e vive sem pedir  comiseração. 

14 comentários:

  1. "vive sem pedir comiseração" - se um dia ponderar uma tatuagem, poderá ser essa :)

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  2. Espelho meu, espelho meu...! Que boa memória tens! Espinhos, dos aguçados, pois, deve ser com eles que fazem as tatuagens, claro!
    Nem, por outro lado, se pode invocar em boa razão, discriminação positiva. Isso, como diria alguém, é "outro osso", em meu entender, que se faz noutro plano de considerações, não pessoal.

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  3. Obrigada, P., pelo que me dás a ver, sobre sentidos e opções. Claro, és benfiquista, há que notar!
    Receber- entregar- receber. Muito bem. Mas as estratégias são proibidas? A razão, mais instrumental, quando se quer, e aceita, em todas as consequências? Saiba a pessoa exercê-la. Creio que me estou a re-ver...
    M.J.

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  4. Dois exemplos femininos?... o estoicismo é alheio aos homens? (isto não é uma pergunta feminista).

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    1. por que haveria de ser alheio aos homens? não percebo a pergunta.

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    2. Não percebe? Ai,, nesse caso! É que eu interpretei as duas descrições estóicas, como sendo uma delas um desdobramento e uma manifestação do próprio blogger... 2 planos, etc...levada em erro pela palavra benfiquista, Agora vejo que foi um equívoco, um erro, melhor dizendo. Ora bolas. Peço desculpa. M.J.

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    3. eheheheh.... o benfquismo é asfixiante....

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    4. Bem, eu só achei "curioso" serem dois exemplos do sexo feminino. Em conversas de mulheres é muito comum haver alguém que afirme, e logo encontra quem dê o seu acordo, que só as mulheres são capazes do estoicismo de que está aqui a tratar.

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    5. Interessante. Pensa que isso corresponderia a dizer que as mulheres agem no mundo pela via dos sentimentos, enquanto os homens talvez sintam na linha das suas ações?
      Mas e se a ação masculina pudesse ser desencadeada por sentimentos femininos? Concorda que as mulheres empoderam os homens? hmm hmm -)
      Para mim, lá no meu contexto, só me lembro de Shiva.

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  5. Obrigada, P., pelo que me dás a ver, sobre sentidos e opções. Claro, és benfiquista, há que notar!

    Receber=entregar. Muito bem. Mas as estratégias são proibidas? A razão, mais instrumental, quando se quer, e aceita, em todas as consequências? Saiba a pessoa exercê-la. Acho que estaria a re-ver-me…

    Crísipo e sua lógica proposicional:

    Amor é entregar=receber: passa a: Se: “se entregar, logo receber” (amor desinteressado); de mais nada se precisaria; não que existisse alguém do outro lado. Pulmões para criar um mundo, em que o outro já lá está pela certeza? Esse mundo criado, seria o destino? A natureza dos nexos, “a co-operação das causas dependendo da natureza das coisas e do carácter do agente”.

    Mas como se liga _ harmoniosamente?_ com outros mundos; outras propensões?

    Por outro lado, “o mal é o bom sob disfarce, e em última instância conducente ao melhor”, tal como a grosseria na comédia”

    E então? Voltas e mais voltas: Se para reparar uma propensão emocional de ir-para-além –do-espelho, propensão que resistia à regra de entregar=receber; que afinal não vigorava assim com tanto sopro…. Faltava o sopro…. Mas quê? Passa-se à regra evolucionária (emocionalíssima) da reciprocidade? Eliminar o batoteiro? Quando existe, que pode nem existir, como pessoa, pelo menos. Revoltejar: é porque é ainda pathos?! Nesse caso, será mais lógico pôe-lhe fim; um modo de lhe pôr fim é pela instrumentalidade! (Nada de amor, só reprodução!)

    Compreensível? Ou desnorteado?

    M.J.

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  6. Falando de mim abertamente, da lista não posso pertencer, pelas razões de que:
    a) Nenhuma impassibilidade à espada! Só que passo demasiado tempo a olhar para baixo de molde a não a ver!
    b) Queixume sobre o corpo, tenho recordação (quer do lado mais orgânico quer corporal), de outro modo não teria estado no discurso;
    c) Inclinação a levar de través a limitação do desejo àquilo que verdadeiramente sob meu controlo; isto é, à natureza, isto é, limitar-me a controlar os pensamentos; desde que aceite com tudo o que implica, o que possa, sou tentada a fazer; por isso é que me queixo tanto do que não posso!
    MJ.

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  7. «o amor e a honestidade só existem se desinteressados» -- nem mais.

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  8. Dr não sei se sou estóica ou não... Sabe que apenas luto pelos meus sonhos, tento viver a minha vida com calma e deixar os dramas para trás. Mas como lhe costumo dizer "um dia de cada vez"
    P.

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